quarta-feira, 28 de maio de 2014

Alimentando com amor... Ou “não crio sobreviventes”

E cá estou eu, refletindo nos meus devaneios maternos, e o assunto da vez, “de novo” é ALIMENTAÇÃO.

É impressionante, como tudo nesse universo paralelo chamado maternidade é surreal, como cada assunto, por mais simples que pareça ser, é motivo para controvérsias, discussões e debates. Fico chocada como tudo, absolutamente tudo, para algumas mães é motivo para se sentir ofendida, ou para ofender a outra.

É claro que todo tipo de criação deve ser respeita, inerentemente, mesmo que não se concorde com ela ou que ela pareça duvidosa, desde que se mantenha os limites de bom senso, e de cuidados básicos. A maternagem é uma coisa muito particular, embora nem todas as mães a façam conscientemente, baseando-se em toda informação pertinente necessária e adequada para desenvolver um maternar consciente e ativo. Mas, cabe a cada um, saber o que lhe é conveniente, o que lhe é de interesse e de que forma prefere agir. E de forma alguma cabe ao outro julgar esse comportamento. E isso, é incontestável. Certo?


Mas como tudo nesse universo é discutível e, todo mundo acha que tem mesmo é que debater a respeito, pitacar, dar palpites e se intrometer na vida alheia e na criação do filho alheio, eis que vivo me deparando com situações complicadíssimas no que diz respeito à alimentação que ofereço para Manuela. As pessoas num geral não compreendem, não concordam, não aceitam, algumas se sentem ofendidas com o meu modo de maternar. Isso porque optei em fazer o máximo possível (e às vezes até impossível, porque haja paciência pra explicar pra todo mundo que ela não toma refrigerante e não come doces) para manter uma alimentação saudável, livre de produtos industrializados, frituras, gorduras,  de excesso de açúcar, sal, corantes e conservantes e seus “parentes próximos”.

Lá em casa, não entram “petit-suisses” (vulgo Danoninho), chocolates, doces, confetes, salgadinhos, refrigerantes e afins. Bolachas recheadas tem acesso restrito, bolachas de qualquer gênero (leite, maisena, biscoito maria, biscoito de polvilho e afins) são limitados, bem como sucos de caixinha, e bolinhos industrializados. A alimentação da Manuela costuma ter pouco sal, pouquíssimo ou nenhum açúcar, e de preferência zero, corantes e conservantes. 

Isso porque, após ler muito a respeito, estudar, pesquisar, e formar a minha opinião, eu cheguei à conclusão de que oferecer uma alimentação saudável, livre de todas as “porcarias modernas e saborosas” seria o melhor caminho para que a minha filha crescesse saudável, e se tornasse uma adulta com saúde e com um paladar rico, adaptado ao sabor das coisas realmente boas da vida (legumes, verduras e frutas, muitas frutas).

Daí certamente à essas alturas você deve estar dizendo: "Essa mulher é maluca ou mentirosa." Eu compreendo, parece mentira, mas não é! Parece loucura, mas não é. Não vou dizer que Manuela nunca tenha provado, mesmo porque, já ofereceram pra ela enquanto eu não estava por perto, e eu já me peguei em situações onde recusar um pirulito seria a maior falta de educação. Mas, o pirulito foi pro lixo assim que o individuo saiu de cena, por sorte ela não curtiu o gosto do "treco". Esquece pirulitos, balas e doces, aliás Manuela nem gosta, e nem pede. Na páscoa, fomos ao mercado e em meio a todos aqueles ovos de páscoa, ela viu a banana no fundo do corredor, e pediu. (Ai que orgulho! rs).

Eu realmente não pretendo oferecer nada dessas coisas pra Manuela por enquanto, mesmo ela estando com quase dois anos de idade, o que de fato não a torna nenhum “adulto“ responsável, com o sistema digestivo completamente maduro e muito menos a faz precisar de alimentos riscos em gorduras, açúcar e coisas do tipo (aliás, isso não é bom pra ninguém, nem mesmo para adultos). Uma vez que, como ela nunca comeu, ou raramente come, não há motivo algum para que eu lhe apresente esses alimentos agora. Eu sei o que vão dizer: “Mas ela já tem dois anos, deixa a menina ser feliz. Você não vai conseguir proibir que ela coma isso o resto da vida.” De fato, não vou conseguir proibir o resto da minha vida, e nem é essa a intensão.

Primeiro porque, o resto da vida é muito, muito tempo, segundo porque o intuito não é a proibição, não pretendo vetar que ela consuma esse tipo de alimento eternamente, a questão aqui é "limitar", e terceiro porque a felicidade de uma criança não está e nem deve estar ligada ao que ela come. Criança feliz é a criança amada, bem cuidada, que brinca e tem liberdade para ser um ser individual e é respeitada em suas particularidades, mas esse é um assunto para outro departamento, e que sugere um post específico.

Resumindo, uma criança não pode ser considerada feliz só porque come chocolate, batata frita e toma refrigerante ou leite com achocolatado antes dos dois anos (ou depois dessa idade). Definitivamente, “deixar que uma criança seja feliz” não me sugere que para que isso aconteça, é necessário oferecer à ela qualquer tipo de alimento “porcaria”, sem valor nutritivo e sem qualquer tipo de vitamina. Deixar uma criança ser feliz na minha humilde opinião, é mostrar à ela que é amada, deixar que ela brinque na terra, com o cachorro, que corra livre pelo quintal, que perceba que ela é respeitada e amada do modo que ela é, e também dar à ela limites, mostrar que a vida oferece desafios e que ela é capaz de superá-los, e que a mãe e pai estão ali sempre para ajuda-la, até que finalmente ela possa vencê-los sozinha.

Para esclarecer como foi que eu cheguei a esse nível de “chatice” com relação à alimentação da minha “cria”, eu vou citar resumidamente em tópicos abaixo alguns dos meus "porquês" com exemplos de alguns tipos de alimentos:

  •  Danoninho (queijinho petit-suisse):

Esse alimento não é indicado para crianças menores de 4 anos, e essa é uma recomendação dos próprios fabricantes. Além disso, embora ele possa ser fonte de algum tipo de vitamina e minerais, a quantidade que realmente existe nele, é bem inferior ao que diz na embalagem.

Ingredientes: Leite desnatado, xarope de açúcar, preparado de morango (água, frutose, polpa de morango, cálcio, fósforo, açúcar, amido modificado, zinco, vitamina E, ferro, maltodextrina, vitamina D, acidulante ácido cítrico, espessantes goma xantana, carboximetilcelulose e goma carragena, aromatizante, conservador sorbato de potássio e corante natural carmim cochonilha), creme, cálcio, cloreto de cálcio, fermento lácteo, quimosina, estabilizantes goma guar, carboximetilcelulose, goma carregena e goma xantana. CONTÉM GLÚTEN. PODE CONTER TRAÇOS DE CASTANHA DE CAJU.

É acidulante, estabilizante e corante de sobra, para um valor nutritivo tão baixo. Num geral, esses queijinhos disfarçados de iogurte não oferecem nada de bom para crianças, além de muito açúcar, corante e gordura. Petit-suisse não é sobremesa, é guloseima, e os próprios fabricantes não indicam para crianças menores de 4 ANOS!

  • Refrigerantes

Além do excesso de açúcar, conservantes e corantes, os refrigerantes não trazem em suas fórmulas qualquer tipo de valor nutricional. Ao contrário disso, refrigerantes são causadores de inúmeras doenças, e aumentam as chances de ataques cardíacos e doenças cardiovasculares, e contribuem para o aparecimento de osteoporose. Por conter uma grande quantidade de açúcar, o refrigerante engorda, mas mesmo que a pessoa não ganhe peso, o refrigerante açucarado pode ser prejudicial para a saúde cardiovascular - especialmente para as mulheres. As mulheres que ingerem bebidas adoçadas com açúcar são mais propensas a desenvolver níveis elevados de triglicérides - gordura no sangue. Pesquisadores descobriram que as mulheres que consumiam pelo menos duas porções de refrigerante por semana, eram quatro vezes mais suscetíveis a ter altos níveis de triglicérides. Esta gordura passa a envolver os órgãos. como o fígado, o que pode contribuir para risco elevado de doença coronariana cardíaca, diabetes tipo 2 e acidente vascular cerebral.


A bebida é saborosa, e isso é indiscutível, mas com tantos “contras”, pra que apresentar uma porcaria desse tipo para uma criança tão pequena?

  • Sucos de caixinhas:

Embora o nome comum para esse tipo de bebida seja “suco”, de suco mesmo, eles não tem nada. O suco, normalmente é feito somente de fruta, e em alguns casos também de um pouco água, e nada mais, o suco não pode conter nenhum tipo de “substância estranha”. Essas bebidas engarrafadas que compramos nos supermercados, são “néctar”, uma pequena porcentagem da polpa da fruta, acrescida de água, muito açúcar, corantes, conservantes, acidulantes, estabilizantes e alguns “antes” a mais. Numa pesquisa realizada pela Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do consumidor), foi constatado que na maioria dos sucos testados, a quantidade de fruta é bem menor do que o exigido pela legislação. Segundo a norma do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento atualmente em vigor, o percentual mínimo de fruta varia de 10% a 40%, dependendo do sabor do néctar.

“Por incrível que pareça, a legislação brasileira não obriga os fabricantes a declararem o teor de açúcar na tabela nutricional. Também não há um parâmetro nacional para avaliação do teor deste ingrediente, então, o Idec usou como base um semáforo nutricional que é utilizado no Reino Unido.
Neste teste, os produtos são classificados nas cores vermelho, amarelo e verde. Os que são classificados como vermelho, caso do Activia e do Dell Vale, por exemplo, tem mais de 12,5 gramas para cada 100 ml. A maior parte das amostras analisadas (67%) receberam a cor amarela, ou seja, tem entre 5,1 e 12,4 gramas para 100 ml.” Fonte: http://maternar.blogfolha.uol.com.br/2014/02/14/cuidado-com-o-suco-de-caixinha-que-da-para-o-seu-filho/

Quando nossos filhos estão bebendo esses sucos, eles estão ingerindo muito açúcar e corantes e pouca fruta. “Os pais precisam saber que são bebidas açucaradas e que, assim como os refrigerantes, não podem ser consumidas sem restrição”, explica a nutricionista do Idec, Ana Paula Bortoletto.

  • Açúcar e doces:

Todo mundo está cansado de saber que, açúcar demais faz mal! Ponto. Estraga os dentes, pode causar diabetes, doenças cardiovasculares, e obesidade. Açúcar demais não é bom! Comer açúcar é desnecessário para a saúde, independentemente da idade. E crianças menores de dois anos não precisam de açúcar. 

Por quê?
Porque açúcar pode viciar o paladar e não contribui para nenhum benefício na saúde de ninguém, não tem valor nutritivo e nem vitaminas suficientes que valham seu consumo desenfreado. Doce é bom? É claro que é, mas precisa de regras e muitas limitações. Uma vez que o paladar da criança é formado até os dois anos de idade, oferecer a ela uma alimentação rica em açúcar pode prejudicar todo o processo de uma alimentação adequada e saudável no decorrer de sua vida.


Pediatras da Escola de Medicina da Universidade de Yale concluíram uma investigação que comprovou antiga suspeita: a ingestão excessiva de açúcar pode deixar as crianças pequenas irritadas e dispersivas. É que o doce, além de provocar maior concentração de insulina no sangue, também aumenta a quantidade de adrenalina; e esse hormônio, em excesso, pode provocar ansiedade, excitação e dificuldade de concentração.

Os açúcares fazem falta na alimentação, mas fazem parte da dieta habitual e são encontrados, por exemplo, no leite (lactose), nas frutas (frutose e sacarose). Pelo processo digestivo são desdobrados em açúcares mais simples. Por exemplo, a lactose é desdobrada em glicose + galactose e a sacarose em glicose + frutose. O amido das farinhas de cereais e dos tubérculos (como a batata) e raízes (como a mandioca) também são desdobrados no intestino em moléculas de glicose. O amido, na verdade, é uma longa cadeia de moléculas de açúcar (de glicose, para ser exato).

Em outras palavras: ninguém pode viver sem açúcar, que é uma fonte de energia, mas a dieta normal tem açúcares naturais em abundância, o suficiente para cobrir nossas necessidades. Esses açúcares não nos fazem mal nem provocam cáries, porque suas moléculas são grandes.

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Há vários outros tipos de alimentos que não ofereço para Manuela, que eu poderia listar, mas a lista ficaria extensa demais (rs). É muito importante ressaltar que, a introdução alimentar só deve acontecer a partir dos 6º mês de vida do bebê, antes disso, ele deve ser alimentado exclusivamente com leite materno. Nada de bolachinhas, doces, suquinhos ou chás, nem mesmo água é necessário para bebês que são amamentados ao peito, exceto por recomendação médica.

A introdução da alimentação sólida deve ser iniciada de modo gradativo e natural, com alimentos frescos, sem açúcar e sem sal. Isso porque é muito importante que o bebê conheça a textura e sabor dos alimentos, para que possa desenvolver uma boa relação com a sua alimentação. Oferecer alimentos industrializados, bolachas, salgadinhos, doces, refrigerantes e afins, não contribuem para a iniciação de um hábito alimentar adequado, não faz ninguém mais feliz, e nem é sinônimo de ser uma “mãe legal”. Mãe legal é aquela que gasta uns minutos na cozinha cozinhado para seu filho, sabendo que ali naquela sopinha de legumes, ele encontrará muitos nutrientes e também muito amor de mãe!

#ficaadica

Fontes:
http://tudosobremae.com.br/bebes-e-criancas/saude/
http://www.asdeliciasdodudu.com.br/2012/06/tudo-que-voce-queria-saber-ou-nao-sobre.html



segunda-feira, 5 de maio de 2014

Quando o movimento é confundido com a causa, e quando isso se torna um problema.


Confundindo ativista com desordeira e preconceituosa. Ou: “Não sou menos mãe porque não tive um parto normal.”


Nessa minha recente inserção no universo de ativismo em prol de uma assistência ao parto mais “descente” e humanizada, e em favor de partos naturais, eu me deparo constantemente com pessoas que definitivamente não compreendem a nossa luta incansável para a melhoria do sistema de saúde brasileiro no que diz respeito à assistência ao parto e saúde da mulher (mas também melhorias no sistema de saúde em geral, já que todo o sistema de saúde brasileiro é lamentável). E essa incompreensão é tamanha, que nos coloca sob pena de sermos confundidas com desordeiras que apregoam ideias ofensivas contra as mães cujo passaram por uma cirurgia de extração fetal e que vão até as últimas consequências para conseguir um parto normal sob quaisquer circunstancias, parindo feito "animais" (é isso que já ouvi!). E isso, tenho que confessar, me tira do meu centro de equilíbrio, me irrita e até, me magoa. Sim! Me magoa, porque algumas dessas pessoas que confundem a minha luta em favor de melhores condições para o parir, com uma luta sem contexto e sem pretextos contra cesarianas, são pessoas a quem prezo muito, e tenho um carinho particularmente especial. E definitivamente não gente... não é nada disso!

Não há uma luta contra pessoas que fizeram algumas escolhas particulares ou simplesmente foram submetidas à elas, esse ativismo, essa luta, essa militância é contra um sistema sustentado por tabus, por mentiras, por uma sociedade tecnocrata e corrompida pela indústria do nascimento.

Diante de todas essas confusões, sinto-me na necessidade de esclarecer alguns pontos sobre esse meu ativismo incansável, que me leva diariamente a ler, escrever e compartilhar ideias, estudos, matérias, relatos à respeito do assunto: Partos no Brasil e no mundo.

Coisa essa, que faço com certa frequência: explicar que luto em favor da saúde da mulher, de melhores condições para uma assistência ao parto digna e respeitosa, luto em favor do respeito à autonomia sobre o próprio corpo, e nunca, jamais, em hipótese nenhuma há uma luta contra mulheres que passaram por uma cesárea. Não partem de mim críticas ou ofensas contra elas, não há intenção de ofender as mulheres cujo, por algum motivo, seja ele qual for, tenham passado pela cirurgia cesariana. Mesmo porque tenho amigas muito queridas que passaram por essa cirurgia, a minha mãe passou por ela três vezes. Como eu poderia ter algo contra a minha própria mãe que me trouxe ao mundo através dessa cirurgia?

Eu confesso, que embora me sinta bem ao explicar essa questão quantas vezes forem necessárias, pois isso é parte inerente da minha vida, as vezes me desagrada ter que explicar uma coisa que deveria ser tão óbvia, e sabe-se lá porque motivo, a maioria das pessoas que não se enquadram no movimento ou não simpatizam com ele, recusam-se a compreender.

É inegável que toda ativista, ou a maior parte delas, em algum momento no início de sua "carreira" tenha perdido a linha algumas, ou muitas vezes. Eu não nego que já me peguei em uma discussão sem fundamento e sem sentido confundindo a causa com o movimento. Mas essa fase obscura passa, a gente começa a refletir, e colocar as ideias no lugar, e a compreender, que essa é uma luta por um bem maior, e não uma luta pessoal para defender tipos de parto. A luta defende a saúde da mulher, defende um modelo obstétrico de qualidade, que respeite a mulher como dona de seu próprio corpo e ponto final. Não há e não deve haver uma luta contra tipos de vias de nascimento. E nós ativistas, entendemos isso. Não parte de nós (ou pelo menos da grande maioria das ativista que conheço), ofensas ou afirmações escusas contra mães que tiveram partos cirúrgicos.

Deixa-me arrematar: de mim nunca partiu, em momento algum a afirmação absurda, sem fundamento: “quem faz cesárea não é uma mãe completa!” Esse tipo de afirmação não faz parte da minha filosofia, do meu pensamento, tão pouco caracteriza o meu ativismo, e quem o faz, na minha humilde opinião não tem NENHUMA ligação com o ativismo consciente ligado à assistência ao parto. Ok?

Vamos entender que, a via de nascimento de um filho não caracteriza mãe, não é um termômetro que mede sua “frequência” em sua função como mãe. Via de parto não mede amor, não determina cuidados, não inferioriza ninguém, e muito menos eleva. Via de parto é só via de parto, não há relação dela com amor materno. Portanto não há necessidade de afirmar "não sou menos mãe" por isso ou por aquilo, porque de fato não é. Não existe menos mãe ou mais mãe. Ninguém disse isso, eu pelo menos nunca vi.
Eu vejo que essa confusão de ativismo contra um sistema falido com ativismo contra cesárea é tão danosa para o nosso “movimento”, quanto o próprio sistema ao qual lutamos contra, porque perdemos possíveis adeptas que poderiam contribuir para a mudança desse quadro lamentável da atual obstetrícia brasileira, e tudo por falta de esclarecimento. Tudo porque se confunde o movimento com a causa, tudo porque distorcem a causa, porque nos limitam a à ela, como se ela fosse nosso único foco.



Vamos esclarecer, a causa é sim o número assustador de cesarianas feitas no Brasil, e o índice elevadíssimo dessas cirurgias que nos leva a “amargar” a primeira colocação no ranking mundial de cesarianas, sendo de 50% no geral, chegando a 90% na rede particular de saúde, contra os 15% recomendado pela Organização Mundial da Saúde, 5% no Japão e 10% na Holanda. 

Temos que mudar o foco, e olhar para o real motivo, o que realmente impulsiona o ativismo em favor do parto normal. Não se trata apenas de uma preferência por esse ou aquele tipo de parto, trata-se de um bem maior, bem este que é em favor de todas as brasileiras. É uma luta em favor de todas as mulheres brasileiras, e não apenas em favor das adeptas dos partos naturais.

O Brasil, amarga também índices elevados de mortes maternas, sendo de 56 mortes para cada 100 mil nascidos vivos, enquanto em países desenvolvidos como o Japão é de apenas 5 mortes para cada 100 mil nascidos vivos, Holanda 6 mortes e Estados Unidos 12 mortes para cada 100 mil nascidos vivos. Diferença pouca né? (Fonte: Consulte aqui)

Se ponderarmos que o índice de cesáreas é 10 vezes maior no Brasil com relação ao Japão e que esse número é igualmente elevado com relação à morte materna, talvez consigamos perceber que há algum problema aqui, e não estamos falando apenas das cesáreas mal indicadas. Esses índices elevados de morte materna, não reflete apenas o problema que enfrentamos hoje com as taxas de cirurgias cesarianas ultrapassando os 50%, esse índice reflete a precariedade que ainda temos no atendimento às gestantes, à falta de uma assistência de qualidade durante o pré-natal, pré-parto, parto e também pós parto!

Nós não estamos falando apenas de cirurgias que podem colocar a vida da mãe e do bebê em risco quando mal indicada (enquanto deveriam apenas salvar vidas diga-se de passagem), estamos falando que há muitas mulheres morrendo ainda, por falta de uma assistência de qualidade. O problema não é a cesárea minha gente, o problema é a saúde pública brasileira, é a assistência ao parto, ela é inadequada. E a nossa luta é para mudar esse quadro. Deu pra compreender?

Se tivéssemos uma saúde de qualidade, com médicos conscientes que dispusessem também de condições adequadas para se trabalhar com dignidade, certamente os índices de mortalidade materna cairiam e muito. E cairia também, esse índice vergonhoso de cesarianas, pois a grande maioria das mulheres que desejam um parto normal receberia apoio quando se tratando de uma gestação de baixo risco, e não teriam que lidar com toda a pressão do seu obstetra para fazer uma cesárea, justificada por um mito qualquer.

Com uma assistência adequada, não haveria tanto o que se temer num parto normal, essas histórias malucas que todas conhecemos bem, de bebês que morreram no parto, de mães que foram humilhadas na maternidade durante o trabalho de parto (violência obstétrica) dentre outras tantas, seriam apenas contos do passado, que não afetariam a confiabilidade da assistência ao parto. Com uma assistência adequada, não haveria tanta indicação duvidosa para cirurgias cesarianas, e com uma assistência de qualidade, as mulheres não precisariam temer pela vida dos filhos, no que diz respeito às dúvidas sobre se o que o médico diz é verdade ou é mentira, porque numa assistência médica adequada e de qualidade, não haveria mitos para sustentar um sistema falido de assistência obstétrica.

Portanto, é contra esse tipo de coisa que nós lutamos! Contra os mitos, contra o sistema, contra a incoerência médica, contra a violência obstétrica. Lutamos por uma saúde pública mais descente, mais digna, por uma assistência à gestante de qualidade, pelos direitos da mulher. Lutamos para que mais mulheres tenham voz no momento mais importante de suas vidas, lutamos para que elas não sejam oprimidas nesse momento, não sejam ridicularizadas, infantilizadas e diminuídas, e para que não sofram violência num dos momentos em que elas se encontram mais frágeis e vulneráveis, lutamos para nós mulheres possamos ser donas dos nossos corpos. Lutamos para que mais mulheres possam ter coragem de assegurar seu desejo de parir com respeito e dignidade, para que mulheres não sejam mais enganadas por aqueles que deveriam lhes prestar todo o esclarecimento necessário à cerca de um parto. Lutamos para que a realidade do Brasil mude no que diz respeito à assistência obstétrica e à saúde da mulher. Lutamos para que as mulheres possam ser respeitadas acima de tudo.

Não há uma luta iminente por partos normais sob quaisquer circunstâncias (nós sabemos que há circunstâncias em que um parto precisa de intervenções, e que isso fique claro), tão pouco, há uma luta contra a cesárea ou contra quem opta por ela. Cesariana é uma cirurgia que salva vidas, e quando bem indicada, ela deve ser "louvada”. Nós, entendemos antes de qualquer ativismo, que a vontade da mulher deve ser respeitada, isso caracteriza também a voz desse ativismo. Então se uma mulher opta pela cesariana de forma consciente e bem informada, assumindo todos os seus riscos, e pesando riscos x benefícios, nós respeitamos isso, antes de qualquer preferência por um parto natural humanizado.

O problema, é que a maior parte das mulheres não opta pela cesárea, se quer tem toda essa consciência sobre os riscos que ela pode oferecer, elas são induzidas a isso, e na maioria dos casos, sem motivos reais, sob argumentos médicos sem fundamento e sem embasamento.

Converse com mulheres que passaram pela cesárea, mesmo aquelas que de certa forma defende a cirurgia, e pergunte à elas o motivo pelo qual passou pela cesárea. As respostas são relativamente sempre a mesma, a maioria começa com o discurso mais ou menos assim: “Eu queria um parto normal mas...”, e o que completa a frase é um mito qualquer que o sistema sustenta, do tipo circular de cordão, bebê grande, bebê pequeno, aumento de liquido, não teve dilatação, posição pélvica. E isso não pode continuar acontecendo, mulheres sendo enganadas porque os médicos não dispõe das mesmas condições para conduzirem um parto normal, já que o que recebem por uma cesárea que dura cerca de 2 horas, é o mesmo que ele receberia por um parto normal, que dura cerca de 12 horas ou mais.

Nós compreendemos também que, "reensinar" os obstetras a conduzirem partos naturais sem intervenções, e os incentivar (financeiramente falando), à realizar esse tipo de parto ajudaria a mudar essa realidade, afinal para os profissionais, o buraco também é mais embaixo. Embora, seja lamentável que por “dinheiro” ou por simplesmente terem desaprendido a conduzirem partos normais, esses mesmos profissionais estejam enganando mulheres todos os dias em seus consultórios.

É contra esse tipo de incoerência ao qual lutamos, e não contra escolhas particulares. Nós lutamos em favor de uma melhoria no sistema de saúde brasileiro, em favor de uma assistência ao parto digna. E é preciso que isso seja compreendido, afinal, todas somos mulheres, todas somos humanas, e todas deveríamos ter a mesma voz ao nosso favor!

Que fique esclarecido afinal, que esse ativismo que se vê por aqui e por aí, em favor de partos humanizados e em favor de melhorias na assistência ao parto, não luta apenas pela "minoria" (infelizmente) que busca por uma parto normal humanizado, esse ativismo luta por você MULHER! E por nós MÃES!!!

Leituras interessantes:

Quer um parto normal? Quer fugir da violência obstétrica? Três novas iniciativas vão te ajudar.(Cientista que virou mãe)

Dez sinais de que você se tornou (ou está se tornando) uma ativista do parto humanizado (Caderninho da mamãe)